Carnê-leão é um nome que assusta.

Quando se comenta com um cliente que será necessário preencher o carnê-leão, ele logo se desespera: medo de ter mais Imposto sobre a Renda – IR a pagar ou de ser multado se fizer de forma incorreta.

Esses medos são plausíveis e entender quando e como preencher o carnê é de extrema importância.

Trataremos, então, sobre o carnê-leão, explicando quem deve preencher, quando e destrincharemos sobre o preenchimento dos rendimentos auferidos no exterior.

Para iniciar, o carnê-leão é um adiantamento do cálculo e possível pagamento do Imposto de Renda ao longo do ano.

Isto é, ao invés de esperar até março e abril do ano seguinte do fato gerador (o recebimento da renda em si), este é tributado mensalmente durante o ano-calendário.

Caso, ao preencher a Declaração do Imposto de Renda, haja IR pago a mais ou a menos, este será apurado dentro da declaração.

Isso significa que você pode pagar R$100,00 de IR todo o mês, durante o ano, porém receber R$600,00 de restituição, ou ter que pagar um pouco mais, a depender de outros rendimentos e despesas que você declarar.


Já quando deve ser preenchido o carnê-leão, a regra é determinada pelo Decreto Legislativo no. 9580/2018.

É necessário preencher o carnê quando a Pessoa Física receber:

  1. Pagamento recebidos de outras Pessoas Físicas – PF (a PF é a fonte pagadora e não fez a retenção do IR) ou
  2. Pagamento recebidos de fontes pagadoras no exterior (PF ou Pessoa Jurídica – PJ).

Veja o texto legislativo:

Art. 118. Fica sujeita ao pagamento mensal do imposto sobre a renda a pessoa física que receber de outra pessoa física, ou de fontes situadas no exterior, rendimentos que não tenham sido tributados na fonte, no País, tais como Lei nº 7.713, de 1988, art. 2º, art. 3º, § 1º art. 8º e art. 9º ; e Lei nº 9.430, de 1996, art. 24, § 2º, inciso IV ):

I – os emolumentos e as custas dos serventuários da Justiça, como tabeliães, notários, oficiais públicos, entre outros, quando não forem remunerados exclusivamente pelo erário;

II – os rendimentos recebidos em dinheiro, a título de alimentos ou de pensões inclusive alimentos provisionais;

III – os rendimentos recebidos por residentes no País que prestem serviços a embaixadas, repartições consulares, missões diplomáticas ou técnicas, ou a organismos internacionais de que o País faça parte;

IV – os rendimentos de aluguéis recebidos de pessoas físicas;

V – os juros determinados de acordo com o disposto no art. 22 da Lei nº 9.430, de 1996 , na forma estabelecida no art. 249 ;

VI – os rendimentos de prestação a pessoas físicas de serviços de transporte de carga ou de passageiros, observado o disposto no art. 39 ; e

VII – os rendimentos de prestação a pessoas físicas de serviços com trator, máquina de terraplenagem, colheitadeira e assemelhados, observado o disposto no § 1º do art. 39  (Decreto no. 9580/2018).


Quem está obrigado a preencher o carnê-leão são os contribuintes Pessoas Físicas residentes no Brasil.


Se você já é oficialmente não residente e recebe um pagamento de uma Pessoa Física residente no Brasil, a apuração do IR não ocorrerá por carnê-leão. Se o item for tributável pelo IR, a regra é que a fonte pagadora ou o procurador do não residente faça a retenção do IR.

Já se você é oficialmente não residente no Brasil e recebe rendimentos de fontes pagadoras  no exterior, mesmo que esses rendimentos sejam transferidos para o Brasil, não há tributação do IR no Brasil (o correto seria receber esses valores em uma Conta de Domiciliado no Exterior).

Se você era residente no Brasil e passou a ser não residente durante o ano-calendário, você terá obrigação da apuração do carnê-leão até o dia de sua caracterização da não residência.


Vamos dar um exemplo:

João era psicólogo no Brasil, exercendo serviços diretamente para Pessoas Físicas no Brasil e no exterior.

Em 01/07/2022, ele se mudou para Indonésia (país sem acordo de não bitributação).

Seu preenchimento do carnê-leão e entrega da Declaração do Imposto de Renda será da seguinte forma:

  • Em 2022, o psicólogo João fará os lançamentos mensais do rendimentos auferidos por Pessoa Física ou recebidos do exterior no carnê-leão web.
  • Se João optar por oficializar a saída definitiva em 01/07/2022, ele preencherá o carnê até a data de saída;
  • Em 2023, o psicólogo deverá então entregar a Comunicação de Saída (prazo final em 28/02/2023), e entregará também a Declaração de Saída Definiva do País – 2023, com data de saída em 01/07/2022.

Se ele optar por se manter como residente por mais 12 meses no Brasil, ele irá entregar a Declaração de Ajuste Anual – 2023 normalmente, informando os rendimentos auferidos no Brasil e no Exterior de 01/01/2022 a 31/12/2022.

  • Em sua DSDP, João incluirá o carnê-leão, com os rendimentos recebidos de Pessoa Física e os rendimentos recebidos do exterior entre 01/01/2022 a 01/07/2022.
  • O que foi recebido após 01/07/2022 terá uma tributação diferente e não será informado no carnê-leão e nem incluído na DSDP.
  • Caso haja IR a restituir ou IR adicional a pagar, o Programa-gerador da DIRPF indicará o valor na DSDP-2023.

Em nosso exemplo, caso o psicólogo siga prestando serviços para as Pessoas Físicas residentes no Brasil, mesmo residindo na Indonésia, o seu procurador ficará responsável pela retenção do IR sobre esses rendimentos. A alíquota será de 25% e deverá ser recolhido no dia do pagamento do serviço prestado.


Texto legal de apoio:

REMESSAS A NÃO-RESIDENTE

Art. 35. Os rendimentos pagos, creditados, empregados, entregues ou remetidos a não-residente por fontes situadas no Brasil estão sujeitos à incidência do imposto exclusivamente na fonte, observadas as normas legais cabívei (IN SRF no. 208/2002).

REMUNERAÇÃO DO TRABALHO E DE SERVIÇOS

Art. 36. Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a não-residente sujeitam-se à incidência do imposto na fonte à alíquota de 25%, ressalvado o disposto no art. 37 (IN SRF no. 208/2002).

RECOLHIMENTO DO IMPOSTO

Art. 44. O imposto retido na fonte de que tratam os arts. 35 a 42 deve ser recolhido na data da ocorrência do fato gerador (IN SRF no. 208/2002).

Responsabilidade do procurador de residente ou domiciliado no exterior

Art. 781. Compete ao procurador a retenção ( Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 100, parágrafo único ):

[…]II – quando o procurador não der conhecimento à fonte de que o proprietário do rendimento reside ou é domiciliado no exterior; (Decreto no. 9580/2018).


Agora que já sabemos quais são os motivos que obrigam um contribuinte a preencher o carnê-leão, assim como quem está obrigado a preencher, vamos a:

Como preencher o carnê-leão!

A partir de 2021, a RFB extinguiu o download do Programa do Carnê-leão.

O preenchimento passou a ser feito no Portal e-cac.

  1. Acesse o Portal e-cac: https://cav.receita.fazenda.gov.br/autenticacao/login
  2. Busque por “Meu Imposto de Renda (Extrato da DIRPF)“, ao clicar no item, será aberto uma nova página;
  3. Na nova página, chamada “Meu Imposto de Renda”, busque por “Acessar Carnê-leão” (está no grupo “Declaração”). Novamente o sistema irá abrir uma nova página.
  4. Se for o seu primeiro acesso ao “Carnê-leão Web”, recomendamos que você inicie por “Configuração”. Em “Configuração”, criei o seu perfil: é autônomo? Tem rendimentos auferidos no exterior? Autoriza um terceiro para acessar o seu carnê-leão (exemplo: se você for dependente de alguém na DIRPF)?
  5. Em seguida vá em “Identificação”, informe pelo menos se você possui dependentes (se você for autônomo, será necessário prestar mais informações).

A partir daqui, iniciaremos o preenchimento de seu carnê-leão efetivamente.


  1. Vá em “Rendimentos”, clique em “ + Rendimento ” (botão azul no canto superior direito):
Screenshot do Carnê-leão Web, aba Rendimentos
  1. Escolha a “Natureza” do rendimento.

Conforme nosso exemplo do psicológo João, ele terá lançamentos de rendimentos de Pessoa Física e do Exterior, então será necessário informar cada recebimento (um por um) e a data exata de cada um deste. Os lançamentos devem ser feitos por dia e por mês.

Informe ainda o “Histórico”, com os dados da fonte pagadora, e o “Valor” bruto recebido.

Quando o valor recebido for em moeda estrangeira, é necessário fazer a conversão do valor para dólar americano e depois para real.


Veja o texto da lei:

Art. 16. Os demais rendimentos recebidos de fontes situadas no exterior por residente no Brasil, transferidos ou não para o País, estão sujeitos à tributação sob a forma de recolhimento mensal obrigatório (carnê-leão), no mês do recebimento, e na Declaração de Ajuste Anual.

§ 2º Os rendimentos em moeda estrangeira e o imposto pago no exterior são convertidos em dólares dos Estados Unidos da América, pelo valor fixado pela autoridade monetária do país de origem dos rendimentos para a data do recebimento e, em seguida, em reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do recebimento do rendimento (IN SRF no. 208/2002).


Vamos supor que João possui um paciente na Alemanha. O paciente paga a João 100 euros pela consulta. João então irá buscar na autoridade monetária alemã a conversão oficial do euro para dólar no dia do recebimento do valor.

Após está conversão, ele irá verificar a conversão do dólar americano para real, para o dia 15 do mês anterior ao recebimento. É possível verificar esse valor no Conversor de Moedas do Banco Central.

O valor final em reais será incluído no carnê-leão.

  1. Se houve pagamentos como IR pago no exterior (apenas para países com acordo de não bitributação ou acordo de reciprocidade), Pensão Alimentícia ou Previdência, incluir em “Pagamentos”:
Screenshot do Carnê-leão Web, aba Pagamento

Texto da lei:

Art. 16. Os demais rendimentos recebidos de fontes situadas no exterior por residente no Brasil, transferidos ou não para o País, estão sujeitos à tributação sob a forma de recolhimento mensal obrigatório (carnê-leão), no mês do recebimento, e na Declaração de Ajuste Anual.

§ 1º O imposto de renda pago em país com o qual o Brasil tenha firmado acordo, tratado ou convenção internacional prevendo a compensação, ou naquele em que haja reciprocidade de tratamento, pode ser considerado como redução do imposto devido no Brasil, desde que não seja compensado ou restituído no exterior  (IN SRF no. 208/2002).


A conversão do IR pago no exterior será a mesma dos rendimentos auferidos no exterior.

  1. Em “Demonstrativo de Apuração Anual”, você poderá ver o resumo de seus lançamentos, os descontos ao IR que você possui direito (por ter dependente, por ter pago IR no exterior, entre outros), e o IR devido.

No Demonstrativo você também poderá emitir o DARF para pagamento do IR devido.


Caso haja IR a pagar, você terá até o último dia útil do mês seguinte ao fato gerador do lançamento para pagá-lo.

Se você preencher o carnê-leão fora do prazo legal, você corre risco de pagar o IR em atraso, com o lançamento de juros e multa de mora em seu DARF.


Para adicionar o carnê-leão a sua Declaração do Imposto de Renda de Pessoa Física, dependerá de como você irá preencher a declaração.

Se for pelo próprio e-cac, o sistema irá lhe direcionar.

Se você preencher a declaração pelo Programa do IRPF, que deve ser instalado em sua máquina, será necessário acesso a sua conta do Portal e-cac.

Caso um terceiro esteja preenchendo a declaração por você, será necessário liberar o acesso para essa pessoa.

Por fim, devemos informar que caso você seja obrigado a preencher o carnê-leão e não o faça, você está sujeito a multa de 50% do o valor do pagamento mensal (em caso de fiscalização e lançamento de ofício).

Fonte: Brasil TAX